quinta-feira, 29 de novembro de 2012

Lusco-Fusco

Sentado. Há um silêncio em tudo. Sentido pelo fato de não querer o visível, o corte ríspido numa realidade crua. Observa o que tem em mãos. Pode ser um livro, pode ser um quarto escuro, pode ser ele mesmo que se vê sobre as palmas das mãos. Sabe que só, em si, não há tanta vida. Resolve abrir as mãos, adentrar o quarto, ler o livro. A porta, os olhos e as letras são o esquecido. Traz à boca alguns sons. Derrama-se uma tempestade sob os olhos, sobre as mãos. Tudo se torna dimensionável: a profundidade, o véu, um corpo opaco que segue um curso de tempo infindável. A voz que não soa cá fora retumba trovões de anseio materno. Ela perpassa todas as idades. Atravessa um vão desconhecido de dores antigas. Traz em si todas as histórias do mundo, as histórias dele: é ele que vem nela; é ela que se observa. Traz a boca ressequida, costurada. Traz o ventre flagelado pelo que se chamara "duas nações". O beijo dela é dele e fica estatelado fora do vão dos sons. Uma pergunta calou tudo. Fechou portas, livros e mãos.

Escher, Drawing Hands (1948)



quinta-feira, 8 de novembro de 2012

Ligamen

Caminhar com entrega é um caminho vivo, por mais absurdo, por mais "imoral", por mais incoerente que seja; o caminho vai revelando suavidades e nós; afrouxa onde dá e dói, consome... Consome aquilo que morre todo dia [segundo após segundo], vai ficando um sabor de vento pós-chama, pós-trauma. Trauma de nau de pedra. Inesgotável... Propôr o inesgotável!
Acreditando, eu, que tudo finda. Mentira! Tudo vive. Os elásticos assustam num primeiro momento, ardem, corroem uma carne que se sabe apodrecendo. Mas vai costurando idéias inconsequentes e que por isso leva a todo lugar: ao tesão, à dor, ao mistério, ao que vem depois, ao que nem chegou, ao perdido, à invalidez, a um riso de - sabe que isso é bom?! Cria um visgo, um não-achado, um ceder. As possibilidades de ambientes e momentos são infinitas. O que vem surgindo é sempre improvável; onde vai dá é sempre desconhecido. Chegamos a uma outra nuvem de desassossego. E acho que é isso que buscamos. O incômodo e o incomensurável saindo de mim.
A música é, singularmente, importante!